Eleições 2018: primeiras impressões
Eleições
2018: primeiras impressões*
Carlos Eduardo Cardozo
cadunew@yahoo.com.br
A eleição de Jair Bolsonaro no Brasil no último domingo, dia
28/10/2018, aponta um cenário muito complexo e de desafios profundos para o
próximo governo. Ele é o sexto presidente eleito após a redemocratização e promulgação
da Constituição de 1988, que completa 30 anos neste ano de 2018. Trata-se da maior vitória eleitoral da direita na história política
brasileira. E não se trata de qualquer direita, mas de uma direita extremada,
militarizada e autoritária em todas as esferas da sociedade, na igreja, na
escola, no partido, em tudo. Esse episódio histórico evidencia a atual fragilidade que se encontra a democracia brasileira.
O pleito de 2018 se situa num horizonte de dois cenários
mundiais que apontam forte tendência. A primeira é o fortalecimento e
crescimento da extrema direita num contexto mundial, a citar o caso do próprio
EUA, e outros países europeus. Os grupos que aderem à essa perspectiva
demonstram um desconforto extremo com a pós-modernidade. Dessa forma, buscam
mobilizar o aparato estatal como forma de reação, visando a retornar a um
passado nostálgico pelo uso da força, se necessário. Apesar de haver variações,
um aspecto comum que distingue os movimentos de extrema direita é uma
combinação de autoritarismo com o que podemos chamar de moralismo, ou seja, a
ideia de que os interesses dos ditos valores tradicionais da família (a
demarcar um modelo hegemônico de família) de um determinado grupo social e
econômico devem se sobrepor aos interesses de toda qualquer variação desse
modelo heteronormativo. Tanto o autoritarismo como o moralismo são
incompatíveis com a democracia pós-moderna, razão pela qual a extrema direita
acaba se afastando dessa órbita política.
Há, ainda, uma crise econômica, que é, também uma tendência
mundial, e que não vai dar trégua no próximo ano. O presidente eleito sabe disso.
Com um programa mais restritivo de direitos sociais e a crise econômica
aumentará a fileira de pobres e miseráveis por todo o Brasil. Com uma política conservadora
e um projeto econômico alinhado com princípios liberais, Bolsonaro, tende a
expor o país a uma subserviência dos Estados Unidos, com privatizações, colocando
em risco a própria soberania nacional. Uma característica desse momento
eleitoral foi a massiva onda de um marketing digital, propagado pelas redes
sociais, mentiras e ataques - fake news.
Há uma força mobilizada por estes processos que não foi dirigida para a
construção do que é comum, do interesse comum, e essa força persiste como
desafio para a democracia, sobretudo no sentido de fortalecer os espaços
públicos de formação da opinião, das demandas políticas e dos processos
participativos considerando a realidade destes novos instrumentos de interação.
Acrescenta-se a este aspecto, uma forte presença religiosa,
de cunho neopentecostal, com uma articulação de uma teologia da prosperidade
que fere a laicidade do estado e exclui outras formas e manifestações
religiosas. Assim, pastoralmente temos que rever o papel das Igrejas que
fizeram a opção preferencial pelo capitalismo e de pastores e padres adeptos da
teologia da prosperidade e discursos segregacionistas contra negros, mulheres e
homossexuais. Os pobres foram abandonados. As lideranças da Igreja Católica se
viram perdidas e muitas vezes imobilizadas diante do momento social. Alguns
pastores apoiaram esse movimento sem qualquer crítica ou impacto em suas
funções eclesiásticas e pastorais. Será preciso um longo caminho educativo para
formar uma nova geração. Pois certamente, os jovens deverão ser os mais
afetados: com trabalhos cada vez mais sucateados, com uma reforma da
previdência que privilegia os ricos a e afortunados e um discurso bélico, que
certamente os jovens pobres serão cada vez mais criminalizados.
Resta-nos a frágil luz de esperança evangélica em líderes que
vivem na justiça e na verdade, trabalhando nas comunidades em todos os cantos
do país, sem incoerências éticas. Há muita gente boa em cada recanto do Brasil.
Será preciso costurar essa gente resistente para fortalecer novos focos de luta
e resistência. É preciso, em meio ao inebriante torpor da derrota, resgatar o
sentido último da opção preferencial pelos mais pobres e fazer ouvir a voz de
Jesus nas bem-aventuranças, que prediz "felizes os pobres", não pela
pobreza, mas na opção que teremos de estar ao lado desses que são os mais
frágeis do sistema capitalista. Não será nada fácil. Exigirá paciência
histórica e esperança escatológica.
* Texto originado de uma entrevista para a Revista Vida Nueva da Espanha.
* Texto originado de uma entrevista para a Revista Vida Nueva da Espanha.
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