1968: o ano da juventude!
“Antes de 1968 não havia o jovem, e sim o moço. Mas essa mocidade era inteiramente subordinada à valorização do modelo adulto.” Michel Misse.
Paris [maio de 68]
A revolução estudantil de maio de 68 começou por um motivo banal. No mês de março, o reitor da universidade de Nanterre proibiu os rapazes de visitar as moças em seus dormitórios. Em protesto, um grupo de cem estudantes invadiu a secretaria da universidade. O reitor, assustado, suspendeu as aulas e chamou a polícia.
Naquele protesto na secretaria da universidade nasceu a figura de um líder estudantil que inspirou uma geração inteira: Daniel “le Rouge” (o vermelho, em francês). Dias depois ele incentivou os estudantes da Sorbonne a seguirem o exemplo da Nanterre. Resultado: a polícia invadiu a universidade e as aulas foram suspensas. Os estudantes e o sindicato de ensino entraram em greve.
Os estudantes tentaram retomar o prédio e resolveram enfrentar as tropas policiais. As ruas viraram um campo de batalha. De um lado, jovens armados de paralelepípedos arrancados das ruas; de outro, policiais e suas bombas de gás lacrimogênio. Sirenes foram ouvidas por dias, fogueiras queimavam em toda parte, centenas de estudantes foram presos. Feridos dos dois lados. Entre uma série de muros pixados, uma frase ficou famosa: “Défense d`interdire!” (É proibido proibir!)
Além dos estudantes, os operários também entraram nas manifestações. Centenas de fábricas foram ocupadas e o número de grevistas chegou a 10 milhões. Bandeiras de Mao, de Fidel, de Che Guevara e de Lênin se juntaram às manifestações. Quase todos os setores da sociedade se envolveram. Pessoas de todas as idades discutiam em auditórios lotados e liam diariamente os boletins dos estudantes.
De repente, o presidente general De Gaulle desapareceu e ninguém sabia direito o que fazer. Os estudantes declararam a anarquia. Mas De Gaulle não demorou muito em reaparecer, com apoio do exército. Declarou que não ia renunciar e convocou eleições gerais para o mês seguinte. A população foi às ruas, dessa vez, em apoio ao presidente. Nas eleições, De Gaulle foi o grande vitorioso e a esquerda, por mais estranho que possa parecer, perdeu espaço político.
Apesar do fracasso eleitoral, Le Rouge disse que aquelas manifestações abriram uma brecha para um movimento social heterogêneo. “Perdemos no político, mas ganhamos no sócio-cultural”.
Os maios de 68 se repetiram ao redor do mundo, com diversos personagens e uma série de realidades diferentes. Zuenir Ventura, em seu livro “1968, o ano que não acabou”, diz que “movida por uma até hoje misteriosa sintonia de inquietação e anseios, a juventude de todo o mundo parecia iniciar uma revolução planetária”.
Uma maneira diferente de ver o mundo
Maio de 68 não pretendia tanto repensar a sociedade, mas mudar a visão do mundo, inventar uma nova filosofia, uma nova cultura. Os estudantes apostavam que, após a sua “revolução” uma outra sociedade, como nunca houve até então na história, seria construída com base naquela nova visão do homem. Por isso, a herança mais concreta de 1968 se inscreve menos no âmbito da política e mais no campo dos costumes, uma mudança nos paradigmas sócio-culturais. A primeira centelha de maio de 68, não foi uma reivindicação financeira ou de uma alternativa à sociedade capitalista: foi um pedido apresentado pelos estudantes para se permitir que os rapazes fossem ao quarto das meninas no campus da universidade de Nanterre. E o mesmo para convidar os professores das faculdades a sacudirem a poeira na qual dormitavam há dois séculos, a virem se juntar à “modernidade”.
Pouco tempo depois de maio de 68, assistimos um espetáculo extraordinário: um professor chegou à sala de aula em “jeans”, na faculdade revolucionária de Vincennes. Era o grande lingüista americano Noam Chomsky. Inútil dizer que as mudanças desencadeadas por maio de 68 em relação aos costumes, no quotidiano, na “visão do mundo”, são uma das maiores heranças desse mês extraordinário: a permissão de as mulheres usarem calças compridas, a fraternidade, a simplicidade, a liberação sexual, o direito ao aborto, o reconhecimento dos casais homossexuais, tudo isso foi efeito direto, às vezes tardio, de 68.
A palavra até então acorrentada se soltou, como louca, meio embriagada. As barreiras sociais, cívicas, educacionais, geracionais, os códigos glaciais de comportamento, tudo desmoronou. Paris falava, falava, como um ébrio. Falava-se qualquer coisa, uma profusão de besteiras e algumas idéias inspiradas. O movimento, ao crescer, se politizou.
Brasil [maio de 68]
No Brasil, as manifestações da juventude também provocaram uma série de mudanças culturais no seio da sociedade. Segundo Zuenir Ventura, o conteúdo moral é a melhor herança que a geração de 68 poderia deixar para um país cada vez mais governado pela falta de memória e pela ausência de ética.
Em 1968, ter menos de 30 anos era motivo de orgulho. Pelé tinha 28 anos e já era o melhor jogador do mundo, Chico Buarque e Caetano Veloso, com 24 e 26 anos, já eram ícones da MPB; Roberto Carlos ainda tinha 25 anos e já era rei; Elis Regina e Gal Costa tinham 22. Era a juventude quem dava a cor da sociedade. Os jovens tinham tomado consciência de seu papel social enquanto juventude, enquanto categoria social fundamental para a sociedade. Era uma reivindicação justa.
Mesmo em uma época de intensa repressão por causa da ditadura, os jovens brasileiros, através dos diretórios estudantis, de passeatas e de manifestações, se fizeram ouvir. Tanto na França quanto no Brasil, uma juventude unida e consciente de seus direitos e de sua força conseguiu mudar a sociedade. Mas isso foi há 40 anos. Hoje em dia, apesar da tão falada apatia juvenil (precisa averiguar de quem é este discurso), muita coisa está sendo feita, haja vista a grande mobilização juvenil ocorrida pelos debates da Conferência Nacional de Juventude, ou mesmo, as formas não-verbais de manifestação social da juventude.
Não precisa ser uma manifestação que ameace o presidente da república, como na França, nem que peite de frente uma repressão violenta da polícia, como no Brasil da ditadura. Ela pode começar na rua, no bairro, na igreja, na escola etc.
Um slogan de maio de 68 era: "É só um começo, continuamos o combate".
O “combate” continua.
Paris [maio de 68]
A revolução estudantil de maio de 68 começou por um motivo banal. No mês de março, o reitor da universidade de Nanterre proibiu os rapazes de visitar as moças em seus dormitórios. Em protesto, um grupo de cem estudantes invadiu a secretaria da universidade. O reitor, assustado, suspendeu as aulas e chamou a polícia.
Naquele protesto na secretaria da universidade nasceu a figura de um líder estudantil que inspirou uma geração inteira: Daniel “le Rouge” (o vermelho, em francês). Dias depois ele incentivou os estudantes da Sorbonne a seguirem o exemplo da Nanterre. Resultado: a polícia invadiu a universidade e as aulas foram suspensas. Os estudantes e o sindicato de ensino entraram em greve.
Os estudantes tentaram retomar o prédio e resolveram enfrentar as tropas policiais. As ruas viraram um campo de batalha. De um lado, jovens armados de paralelepípedos arrancados das ruas; de outro, policiais e suas bombas de gás lacrimogênio. Sirenes foram ouvidas por dias, fogueiras queimavam em toda parte, centenas de estudantes foram presos. Feridos dos dois lados. Entre uma série de muros pixados, uma frase ficou famosa: “Défense d`interdire!” (É proibido proibir!)
Além dos estudantes, os operários também entraram nas manifestações. Centenas de fábricas foram ocupadas e o número de grevistas chegou a 10 milhões. Bandeiras de Mao, de Fidel, de Che Guevara e de Lênin se juntaram às manifestações. Quase todos os setores da sociedade se envolveram. Pessoas de todas as idades discutiam em auditórios lotados e liam diariamente os boletins dos estudantes.
De repente, o presidente general De Gaulle desapareceu e ninguém sabia direito o que fazer. Os estudantes declararam a anarquia. Mas De Gaulle não demorou muito em reaparecer, com apoio do exército. Declarou que não ia renunciar e convocou eleições gerais para o mês seguinte. A população foi às ruas, dessa vez, em apoio ao presidente. Nas eleições, De Gaulle foi o grande vitorioso e a esquerda, por mais estranho que possa parecer, perdeu espaço político.
Apesar do fracasso eleitoral, Le Rouge disse que aquelas manifestações abriram uma brecha para um movimento social heterogêneo. “Perdemos no político, mas ganhamos no sócio-cultural”.
Os maios de 68 se repetiram ao redor do mundo, com diversos personagens e uma série de realidades diferentes. Zuenir Ventura, em seu livro “1968, o ano que não acabou”, diz que “movida por uma até hoje misteriosa sintonia de inquietação e anseios, a juventude de todo o mundo parecia iniciar uma revolução planetária”.
Uma maneira diferente de ver o mundo
Maio de 68 não pretendia tanto repensar a sociedade, mas mudar a visão do mundo, inventar uma nova filosofia, uma nova cultura. Os estudantes apostavam que, após a sua “revolução” uma outra sociedade, como nunca houve até então na história, seria construída com base naquela nova visão do homem. Por isso, a herança mais concreta de 1968 se inscreve menos no âmbito da política e mais no campo dos costumes, uma mudança nos paradigmas sócio-culturais. A primeira centelha de maio de 68, não foi uma reivindicação financeira ou de uma alternativa à sociedade capitalista: foi um pedido apresentado pelos estudantes para se permitir que os rapazes fossem ao quarto das meninas no campus da universidade de Nanterre. E o mesmo para convidar os professores das faculdades a sacudirem a poeira na qual dormitavam há dois séculos, a virem se juntar à “modernidade”.
Pouco tempo depois de maio de 68, assistimos um espetáculo extraordinário: um professor chegou à sala de aula em “jeans”, na faculdade revolucionária de Vincennes. Era o grande lingüista americano Noam Chomsky. Inútil dizer que as mudanças desencadeadas por maio de 68 em relação aos costumes, no quotidiano, na “visão do mundo”, são uma das maiores heranças desse mês extraordinário: a permissão de as mulheres usarem calças compridas, a fraternidade, a simplicidade, a liberação sexual, o direito ao aborto, o reconhecimento dos casais homossexuais, tudo isso foi efeito direto, às vezes tardio, de 68.
A palavra até então acorrentada se soltou, como louca, meio embriagada. As barreiras sociais, cívicas, educacionais, geracionais, os códigos glaciais de comportamento, tudo desmoronou. Paris falava, falava, como um ébrio. Falava-se qualquer coisa, uma profusão de besteiras e algumas idéias inspiradas. O movimento, ao crescer, se politizou.
Brasil [maio de 68]
No Brasil, as manifestações da juventude também provocaram uma série de mudanças culturais no seio da sociedade. Segundo Zuenir Ventura, o conteúdo moral é a melhor herança que a geração de 68 poderia deixar para um país cada vez mais governado pela falta de memória e pela ausência de ética.
Em 1968, ter menos de 30 anos era motivo de orgulho. Pelé tinha 28 anos e já era o melhor jogador do mundo, Chico Buarque e Caetano Veloso, com 24 e 26 anos, já eram ícones da MPB; Roberto Carlos ainda tinha 25 anos e já era rei; Elis Regina e Gal Costa tinham 22. Era a juventude quem dava a cor da sociedade. Os jovens tinham tomado consciência de seu papel social enquanto juventude, enquanto categoria social fundamental para a sociedade. Era uma reivindicação justa.
Mesmo em uma época de intensa repressão por causa da ditadura, os jovens brasileiros, através dos diretórios estudantis, de passeatas e de manifestações, se fizeram ouvir. Tanto na França quanto no Brasil, uma juventude unida e consciente de seus direitos e de sua força conseguiu mudar a sociedade. Mas isso foi há 40 anos. Hoje em dia, apesar da tão falada apatia juvenil (precisa averiguar de quem é este discurso), muita coisa está sendo feita, haja vista a grande mobilização juvenil ocorrida pelos debates da Conferência Nacional de Juventude, ou mesmo, as formas não-verbais de manifestação social da juventude.
Não precisa ser uma manifestação que ameace o presidente da república, como na França, nem que peite de frente uma repressão violenta da polícia, como no Brasil da ditadura. Ela pode começar na rua, no bairro, na igreja, na escola etc.
Um slogan de maio de 68 era: "É só um começo, continuamos o combate".
O “combate” continua.
Comentários